Segundo especialista, caso a redução da maioridade penal seja sancionada, poderá haver reflexos em direitos e deveres dos adolescentes
A aprovação da emenda que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos em caso de homicídio doloso (quando há intenção de matar), lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos (estupro, sequestro, latrocínio – roubo seguido de morte – e homicídio qualificado, por motivo fútil ou torpe) pode abrir caminho para a alteração de outros aspectos na legislação.
Em entrevista ao Portal da Band, a advogada e especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal Natália Rosa Mozzatto esclarece sobre as possíveis mudanças caso a medida seja sancionada – a PEC ainda será votada mais uma vez no plenário da Câmara e em dois turnos do Senado. Segundo ela, haverá reflexos, por exemplo, na idade mínima para se obter a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) no Brasil.
Confira abaixo como é agora e como pode ser após as votações:
IDADE PARA DIRIGIR
Como é: Para obter a CNH, é necessário ter 18 anos completos, saber ler e escrever, ter documento de identidade e ser penalmente imputável, ou seja, estar apto a responder por seus atos criminalmente.
Como será: Segundo a especialista, a redução da maioridade penal terá reflexos na idade para começar a dirigir. Isso porque o objetivo da PEC 171/93 é a alteração do artigo 228 da Constituição Federal (que trata como penalmente inimputáveis os menores de 18 anos), que reduz a idade penal a 16 anos.
O Detran do Rio Grande do Sul, por exemplo, já abordou o assunto – e confirmou a tese de que, com a PEC aprovada, adolescentes a partir de 16 anos já poderiam obter a CNH. O diretor-geral do Detran RS, Ildo Mário Szinvelski, também se posicionou contra a medida, em um artigo publicado na AND (Associação Nacional dos Detrans): “reduzir a maioridade penal significa contribuir para aumentar a exposição dos jovens ao risco, bem como, igualmente, contribuir para um possível aumento da acidentalidade para toda a sociedade”.
IDADE PARA BEBER
Como é: para o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) é considerada criança a pessoa com idade inferior a 12 anos e adolescente entre 12 e 18 anos, sendo que a lei proíbe a venda ou qualquer forma de fornecimento de bebidas alcoólicas e cigarros a crianças e adolescentes.
Como será: continuará válida a proibição de venda de álcool a adolescentes e crianças contida no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). O que poderia acontecer é que, com a redução de maneira geral, a norma do ECA deixaria de ser aplicada contra quem realizasse a venda destes produtos para pessoas de 16 e 17 anos, pois não se tratariam mais de adolescentes.
Segundo a especialista Natália Rosa Mozzatto, é provável que continue valendo a atual proibição do ECA.
CRIMES HEDIONDOS, HOMICÍDIOS DOLOSOS E LESÕES CORPORAIS SEGUIDAS DE MORTE
Como é: todo menor de 18 anos que praticar um ato considerado como crime estará sujeito ao ECA, na qual o infrator não recebe uma pena e, sim, uma medida socioeducativa, que pode ser advertência, obrigação de reparar os danos, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. A medida mais grave é a internação, onde o adolescente pode ficar até três anos apreendido.
Caso o adolescente tenha 16 ou 17 anos e for encaminhado à Fundação Casa, ele pode permanecer até os 21 anos cumprindo a medida que estiver pendente. Isto quer dizer que não necessariamente ele é “solto” ao completar 18 anos, se ainda houver medida a cumprir.
Como será: os menores de 16 anos já serão considerados responsáveis caso cometam um dos crimes listados acima. Em uma nova votação, a Câmara dos Deputados aprovou a medidas retirando crimes hediondos como roubo com causa de aumento de pena, tortura, tráfico de drogas e lesão corporal grave e manteve homicídio doloso – quando há intenção de matar – lesão corporal seguida de morte, estupro, sequestro, latrocínio – roubo seguido de morte – e homicídio qualificado, por motivo fútil ou torpe.
O adolescente (considerado adulto) cumpriria a pena prevista no Código Penal em estabelecimento prisional, mas em separado dos maiores de 18 anos.
CRIMES “MENORES”
Como é: os crimes “menores” praticados por jovens, como furto, ameaça e estelionato, por exemplo, são tratados como ato infracional e regidos pelo ECA.
Como será: não teriam alterações, já que o texto aprovado prevê a responsabilização criminal dos adolescentes de 16 e 17 anos apenas nos casos de crimes hediondos. Com isso, os atos infracionais dos menores continuariam sendo regidos pelo ECA.
TEMPO DE DETENÇÃO DE MENORES
Como é: as medidas socioeducativas cumpridas em instituições com a Fundação Casa, em São Paulo (semiliberdade e internação), têm prazo máximo de três anos para os adolescentes menores de 18 anos.
Como será: continuará igual para menores de 16 anos. Não terá mudança quanto aos adolescentes que já estão internados cumprindo as medidas. A nova legislação só será aplicada a partir da data em que for promulgada.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil